quarta-feira, agosto 16, 2006

Contras e contras?!

Tanto tempo longe, tempo de fazer um balanço.

Um semestre de Brasília. Na verdade, pouco mais de quatro meses. Escrevo este do Sul.

Não me apaixonei e nem passei a odiar aquele pedaço estranho do Planalto Central. Em meio a coisas que me fizeram suspirar e outras que me reviraram o estômago, mantenho um gosto de intensidade mediana por uma cidade que me parece, acima de tudo, ilusória.

Com todo o respeito, Niemeyer construiu monumentos lindos sem nenhuma funcionalidade. Nas primeiras semanas, vi um luar cinematográfico, à direita do Congresso Nacional, de cima de um viaduto que cobre a rodoviária. Mas os prédios da Câmara e do Senado, cujos gabaritos são os mais altos do plano piloto, correm sério risco de incêndio e têm um espaço completamente irracional. Acho que a única que ainda teve coragem de manter gabinete ali foi a senadora Roseana Sarney.

Com berço francês, formação estrangeira e lugar definido na sociedade estratificada brasileira, Lúcio Costa desenhou uma cidade para os seus. Tudo planejado para não levar “o povo” para os palácios do poder. As distâncias são enormes. A quantidade de espaço tomado pela grama é incompreensível. Não se reconhece a vegetação do cerrado por ali e se gastam litros e litros de água com irrigação. Há muito pouco tempo, quase não existiam calçadas e as faixas nas estradas, com mais de três pistas, são irracionais. A rodoviária, na junção das asas com o corpo do avião, transformou-se num grande equívoco. Não estava nos seus planos fazer dela um espaço de concentração popular. Mesmo assim, algumas coisas conspiraram a seu favor. Caminhar dali até o Congresso, cedo pela manhã, é um desafio. Não só porque a distância é maior do que parece, mas também porque o sol nasce atrás do Congresso e olhar para frente e continuar caminhando é um esforço considerável.

A sucessão de governos do Distrito Federal colaborou para manter esse princípio segregacionista da cidade do poder. O transporte público é uma... um caos. Os ônibus estão caindo aos pedaços, a passagem é caríssima e as linhas não têm nenhuma interligação. Outro dia, fui de um ponto da Asa Norte até a rodoviária e paguei 3,57 reais. Além de absurda, a tarifa é burra. Quem paga 3,57?!? De 4 reais, recebi 40 centavos de troco, é claro. Acho que muitas das promessas dos candidatos a governador do Distrito devem girar em torno disso. Impossível é acreditar, porque, seguindo a idéia de que é uma cidade construída para ricos, podem aumentar o número de vagas nos estacionamentos do plano piloto, mas o transporte público vai continuar se deteriorando, até que “a ralé desista de transitar por onde não deve”.

Na universidade passei a ver as coisas de uma forma mais maniqueísta. É preciso, de toda a forma, separar o joio do trigo. Aprendi uma coisa que deveria ter aprendido já há muito tempo: existem alunos que valem mais do que professores. Em busca de uma área mais “humana”, que me desse pistas de como “salvar o mundo”, pulei da publicidade para o jornalismo, do jornalismo para a ciência política e já começo a pensar onde é que vou parar. A tática é ficar próxima dos poucos professores que valem a pena, como dizem os próprios alunos que valem a pena, e tentar lutar contra a epidemia de mau caratismo que assola os bancos universitários. Tenho uma história muito boa pra contar, mas acho que vou debruçar-me sobre ela só no final de semana.

Bom... olhando pra todas essas linhas que acabaram de sair, parece-me que seria mais coerente odiar esse reduto de representantes pouco representativos. É... sei lá. Mas eu também sofro da doença contemporânea do individualismo e acho que esse lugar pode ser interessante para viver uns anos da minha vida com marido, cachorro e filhos. Os Ipês daqui são deslumbrantes. A paisagem de verdade do cerrado é inesquecível. Encontrar um outro sobrevivente dessa espécie em extinção que é o ser humano é uma sensação única. Bom... paremos por aqui, porque encontrar alguns oásis nesse deserto pode começar a parecer ridículo.