quinta-feira, fevereiro 24, 2005

Comunicação: a escolha pelo silêncio

É sempre difícil discutir sobre as agruras e os êxitos do jornalismo brasileiro. Uns dizem que a objetividade deve ser insistentemente perseguida e outros defendem a militância. A maioria segue as teorias americanas de difusão da informação, mas sempre encontramos os que preferem modelos menos positivos.

Mas, deixando de lado a necessidade de analisarmos se o jornalismo que lemos, ouvimos e vemos é engajado ou não, patrocinado ou não, sério ou marrom, existe uma necessidade primeira, que vem antes da notícia, da reportagem, do editorial, da nota. Jornalistas podem escolher falar ou calar. Nesse mundo "globalizado", onde as notícias pipocam por todos os lados, é necessário selecionar o que será notícia. Esse é o grande esquema.

Escolher falar do esforço do nosso querido presidente do mundo em expulsar os 14 mil soldados sírios do território libanês é escolher calar sobre os possíveis 120 mil soldados americanos que insistem em lutar por uma incompreensível democracia no Iraque. Noticiar a pressão do governo americano contra as armas nucleares mantidas pelo governo da Coréia do Norte é esquecer as 480 armas nucleares que os EUA mantêm somente na Europa. Escolher dedicar generosos dois minutos a uma matéria sobre os dez leões apreendidos pelo IBAMA em Minas Gerais, que serão doados a um zoológico na África, é escolher noticiar o incêndio numa favela da zona leste de São Paulo, que deixou 180 famílias desabrigadas, em apenas dez segundos. Tempo nitidamente insuficiente para encontrar possíveis causas e analisar conseqüências. Cito as palavras de Gustavo Barreto, do www.consciencia.net: "Não se sabe qual foi a causa. Repito: não se sabe qual foi a causa. Mas o Jornal Nacional nem se preocupou com isso: foi logo dizendo que o problema foi na rede elétrica, que é supostamente clandestina. Pronto: culpa dos moradores, quem mandou não ter dinheiro para ficar dentro da lei?"

É por essas e outras que continuo acreditando que o tal do jornalismo objetivo e imparcial é balela.

terça-feira, fevereiro 22, 2005

Primeiro uivo!

Carta enviada à direção e parlamentares do PT eleitos pela região de Joinville - SC.
"A idade do PT praticamente coincide com as nossas. Nossas trajetórias em direção à compreensão de que é preciso se posicionar politicamente, lutar pela democracia e pelo pluralismo, resgatar a ética e a perseguição do bem comum no poder público e trabalhar para minimizar a extrema desigualdade social que nos assola acompanha a história e o crescimento do partido. Por isso, muito antes de nos filiarmos formalmente, travamos um compromisso com o Partido dos Trabalhadores. Identificamo-nos com suas bandeiras e seu esforço em se manter conectado e compromissado com as aspirações sociais contemporâneas. Filiamo-nos à ideologia e ao programa partidário e passamos a "ser PT", pois nos sentíamos contemplados nos seus valores e princípios.
Finalmente, depois de muita luta, o partido conquistou o mais alto cargo do poder executivo. Deparou-se com uma realidade dura, um sistema político por demais emaranhado, barreiras muito mais sólidas do que havia imaginado encontrar. E hoje está difícil entender esse novo movimento do partido diante de sua nova condição, tentando combinar tradição com renovação partidária, já que se tornou extremamente complexo identificar e compreender como atuam todas as forças envolvidas no sistema político nacional. Temos a sensação de que a vitória do pragmatismo desfigurou o partido.
Contudo, se nos falta fôlego e informação para dominar todas as questões envolvidas em âmbito nacional, sobram-nos fundamentos e experiência para avaliar o partido ao qual nos filiamos em nível local. A força que, até pouco tempo, estava comprometida com a mudança social, com a defesa da ética, da moralidade pública e do republicanismo, parece perder-se na obsessão de se tornar eficaz na luta política e institucional. A última campanha eleitoral evidenciou uma crise de degeneração política e moral do PT local. As carreiras individuais sobrepuseram-se ao projeto coletivo. São inúmeros os casos que alicerçam tal transformação: a centralização da coordenação da campanha; a falta de critério e avaliação para a definição dos gastos; a disputa acirrada e precipitada por cargos executivos; a falta de pluralismo; a desvalorização de companheiros engajados com o projeto partidário; o respeito incompreensível por alianças políticas confusas, incoerentes e inexistentes; a barganha política. Vimos companheiros detentores de cargos legislativos deixarem de lado o apoio a lutas e projetos sociais importantes para trabalharem prioritariamente pela manutenção de seus cargos. Vimos investirem na aparência e não no conteúdo.
De nossa parte, mantemos os mesmo valores e princípios que nos aproximaram do partido. Continuamos imbuídos da idéia de que a luta deve se dar em direção a uma sociedade que combine igualdade de direitos e respeito às diferenças. Esta luta, entendemos, pode ser feita independentemente de cargos; estes devem ser conseqüências de um trabalho que alcance as bases e surta resultados entre aqueles que inspiraram nossa concepção: trabalhadores, minorias e toda sorte de gente às margens do sistema capitalista excludente. No entanto, a sensação é de impotência diante de um cenário em que o poder parece ter se tornado um fim em si mesmo. Antigos adversários, comprometidos desde sempre com o sistema que tanto condenamos, passaram a compor o quadro "paz e amor". O selo do movimento hippie que nos antecedeu na contestação de uma sociedade injusta, discriminatória e segregacionista é reinterpretado como sinônimo de "se não puder vencer o inimigo, alie-se a ele".
Expusemos as nossas críticas, mas ninguém se pronunciou. Mais uma vez, talvez pela última, tentamos nos fazer ouvir. Não há espaço para atitudes intransigentes. Compreendemos que é preciso ter tolerância aos erros e debilidades, mas também coragem e brio para admitir as falhas e delas extrair lições e implementar medidas para superá-las. Por isso nos pronunciamos na esperança de motivar a reflexão, pois nosso desejo tem sido o de bater em retirada na direção de outros coletivos que acolham nossos anseios, projetos sociais sinceros e, porque não, nossas utopias. "
Maria Elisa Máximo e Helena Máximo

contributors


Helena depois de um capuccino. Homenagem à Elisa que deve sentir o friozinho do Canadá por algum tempo ainda. Posted by Hello